Por que a depressão está entre nós?


A depressão nos dias de hoje é considerada uma das doenças mais impactantes, atingindo uma em cada quatro pessoas e, segundo a OMS, será a patologia que mais incapacitará indivíduos em 2020.

Atualmente, mais de 120 milhões sofrem com ela no mundo e estima-se que, apenas no Brasil, já seriam 17 milhões acometidos pela doença.

Não se sabe exatamente quais seriam as causas da depressão, entretanto, sabe-se que ela é multifatorial, ou seja, possui componentes genéticos, biológicos e ambientais. Uma pessoa, por exemplo, que registre na família algum caso de depressão, possivelmente apresentará maiores chances de a doença se manifestarem sua vida.

Como clínico da psicoterapia, tenho pensado muito em como a vida de hoje (e os aspectos ambientais) poderiam estar contribuindo para o desenvolvimento da depressão.

Veja só: não temos relatos de que a doença fosse tão recorrente em épocas passadas. Eu sei que talvez antigamente ela não fosse ainda tão notória, uma vez que não havia um conhecimento tão estruturado, bem como formas mais claras de diagnóstico e rastreio, o que nos daria uma falsa noção de que ela não estivesse entre nós. Entretanto, é possível que ela fosse impactante, mas de maneira mais silenciosa.

Mas, vejamos ainda: dificilmente, no começo do século passado, as pessoas eram tão assoladas com preocupações na proporção que as vivemos hoje. Pense comigo: será que nossos bisavós gastavam, em média, uma hora para chegar ao trabalho? (Ipea, 2013) É bem possível que não. E a volta para casa? Seria ela circundada de mais trânsito caótico após um longo dia de atividades? Possivelmente não também.

Será que eles ficavam preocupados de maneira aflitiva com a possibilidade de um assalto iminente nos moldes que temos hoje? Provavelmente não.

É possível que nossos antepassados retornassem para casa logo no final da tarde, onde se relacionavam com a família, dividiam algumas tarefas domésticas e, na hora de ir para a cama, não tinham tanta dificuldade para dormir, pouco e mal, a exemplo de como se vive hoje nos grandes centros (Ipom, 2013).

Nossos antepassados, inclusive, após uma noite reparadora, possivelmente se levantavam da cama bem mais animados, pois não eram atormentados pelos celulares e tablets que apitavam a noite toda.  É possível ainda que tomassem café com mais tranquilidade antes de sair para o trabalho, sem estarem já amargurados e aflitos pelos e-mails ou mensagens de texto que teriam recebido antes mesmo de sair da cama com os problemas que os aguardavam nas empresas.

Possivelmente, eles também não estavam tão apreensivos com as contas do cartão de crédito e com as pendências financeiras que cairiam no final do mês, pois a mobilidade econômica para outras camadas sociais era praticamente inexistente. Assim, o sentimento de inferioridade e de incapacidade possivelmente os visitava com menor proporção, pois se satisfaziam com aquilo que tinham.

Não havia também tanta pressa para se viver, ainda que a expectativa de vida fosse menor, se comparada à que temos nos dias de hoje.

Talvez não houvesse tanta pressão no trabalho, competição para mais resultados, alianças contra colegas, avaliações psicológicas que cotidianamente lhe apontavam suas falhas ou “seus talentos” não desenvolvidos. E, possivelmente, não havia imposição para se fazer um MBA, pois era comum permanecer em um mesmo cargo por anos a fio até que, em um determinado momento, a promoção naturalmente aconteceria.

Nossos antepassados também não sabiam da importância de se fazer alguma atividade física. Assim, não lhes pesava a obrigação de fazer algum tipo de exercício ou ainda fazer spinning em uma academia três vezes por semana com um professor que grita mais alto do que a música que embala a atividade (e que possivelmente é mais alta do que a turbina de um avião). Isso era decorrente do fato de que não se preocupavam tanto com as medidas corporais, visíveis nas barrigas ou nas celulites, além do fato de que os trajes de banho usados nas praias mais cobriam do que mostravam.

Não havia uma imposição social tão grande para se atingir um corpo perfeito. Eles eram aquilo que em sua genética herdavam, sem culpas, constrangimentos ou frustrações.

Nossos antepassados possivelmente também não tinham tantos problemas com os filhos. Sabia-se da autoridade dos pais e ninguém imaginaria desafiá-la. Não ouviam sobre usar a ritalina para tratar do déficit de atenção ou sobre o bullying que seus filhos estariam praticando ou sofrendo. Possivelmente, por se relacionarem mais com a prole, sua presença conseguia aquietar as inseguranças infantis e juvenis, não empurrando assim o problema para que as escolas tivessem a incumbência de resolvê-los. As mães, nessa época, possivelmente também não tinham crises de identidade, por não colaborarem economicamente com as contas da casa.

E, finalmente, os casais ficavam com a mesma pessoa por muito mais tempo, pois as separações eram coisas muito mais raras, o que possivelmente lhes trazia menores níveis de inquietudes pessoais. Simplesmente ficava-se casado(a).

Assim, creio que a pressão de ontem era imensamente menor e as pessoas viviam com aquilo que a realidade lhes disponibilizava. Talvez, muitas vezes, descontentes na posse de suas limitações, mas possivelmente mais pacificados em suas possibilidades.

Com menos tensão interna, com um sono mais reparador, com relações interpessoais mais estáveis, possivelmente sofressem menos de estresse, o que fazia com que seu organismo não se sentisse tão agredido e que resultava em uma busca de alimentos menos calóricos. Portanto, é possível que tivessem uma relação mais saudável com a comida e, ainda que comessem praticamente de tudo, sem restrições, possivelmente não sofriam tanto com a obesidade na forma como sofremos hoje.

Ao olhar para o nosso cotidiano e para a vida que levamos, não seria de se surpreender então que a depressão, mais dia ou menos dia, possa bater a nossa porta.

Vivemos na maior parte do tempo infelizes, incompletos, pressionados, insatisfeitos e, o pior de tudo, profundamente angustiados.

A pergunta que lhe faço, portanto, é: realmente você acha que é possível viver assim?…

Obviamente que não, pois nossa evolução não nos preparou para viver da forma que a realidade moderna nos permite. Portanto, talvez esteja na depressão uma das poucas respostas que o organismo humano ainda consegue dar à falta de perspectiva, sentido e de controle sobre a vida.

A depressão, com a sua anedonia característica – que é a incapacidade de se extrair prazer e satisfação das coisas – está aí, possivelmente para nos sinalizar algo.

“É a depressão que você sente quando o mundo como é não se alinha com aquilo que você acha que deveria ser”, John Green.

Faça algo por você e por sua vida, ao invés de sentir-se apenas vítima de uma existência desgovernada.

Reinvente-se. As escolhas estão aí exatamente para cumprir esse papel. (Fonte: cristianonabuco.blogosfera.uol.com.br)

 



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