Kléber e Carlo Keith Barroso Cavalca responderão pelo artigo 15 da Lei dos Transplantes, que prevê até oito anos de prisão para quem comercializa ossos, tecidos ou órgãos
PRESOS - Kléber e Carlo Keith Barroso Cavalca são filhos de médico ortopedista - Foto: Divulgação
Os marilienses Kléber e Carlo Keith Barroso Cavalca, de 42 e 37 anos, respectivamente, foram presos pela Polícia Civil do Estado do Paraná acusados de manter um banco de ossos humanos clandestino em Londrina. Os irmãos são filhos de um médico ortopedista.
A ação foi desencadeada pela Nucrisa (Núcleo de Repressão aos Crimes contra a Saúde) anteontem (4). De acordo com a delegada Sâmia Coser, em um laboratório mantido em uma casa na zona sul da cidade foram apreendidos pedaços de fêmur in natura, 89 frascos com pedaços de ossos em blocos e 46 frascos com pedaços de ossos moídos em liquidificador.
Já em um apartamento localizado na Gleba Palhano, bairro nobre de Londrina, os policiais apreenderam quatro pedaços da parte conhecida como “cabeça” do fêmur. Os ossos estavam na geladeira, ao lado de alimentos. O gerente da Vigilância Sanitária local, Rogério Lampe, classificou como “macabro” o cenário encontrado no laboratório clandestino e no apartamento.
Ainda segundo a delegada, não foram identificados receptadores dos ossos - que seriam usados para fazer preenchimento ósseo em casos de implante dentário -, no entanto documentos apreendidos indicam que eles eram vendidos para odontologistas em cidades como Belo Horizonte (MG), Goiânia (GO), Vitória (ES), Salvador (BA), Chapecó (SC) e Xanxerê (SC) e enviados pelos Correios.
“Ainda não conseguimos apurar qual é a origem dos ossos nem quantificar as pessoas que foram vítimas do uso desse material. Sabemos que os compradores eram dentistas de vários Estados”, informou a delegada do Nucrisa.
De acordo com a odontóloga Ana Carolina Pinto, da Vigilância Sanitária do Paraná, os ossos humanos são vascularizados, ou seja, têm sangue em seu interior. Por isso, se o doador tem alguma doença contagiosa, ela pode ser transmitida ao receptor.
“Nos bancos de ossos regularizados são feitos muitos testes para constatar se não há qualquer tipo de contaminação. Se for encontrado qualquer vírus ou bactéria no osso ele é descartado. Neste caso, não há garantia de que os testes tenham sido realizados nem de que os doadores ou seus familiares estivessem cientes da doação”, informou.
MAIS
No Brasil existem apenas seis bancos de ossos legalizados. O de Curitiba está interditado parcialmente por razões sanitárias. De acordo com o Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná, que gerencia o serviço, o local está em reforma para se adequar às exigências da Vigilância Sanitária do Estado.
“Há uma série de trâmites a serem seguidos para que um osso seja doado e depois implantado em outra pessoa. Além disso, não há muita disponibilidade de ossos em condições de implante no país, por causa do baixo índice de doadores. Como não respeitavam as condições legais e sanitárias básicas, eles (os suspeitos presos) sempre tinham o material para oferecer”, completou a delegada Sâmia Coser.
Ela suspeita que o comércio ilegal de ossos humanos acontecia desde 2004, quando os suspeitos tentaram abrir um banco de ossos legalizado. Eles não conseguiram por causa de um parecer contrário da Central de Transplantes do Paraná.
A delegada informou que as investigações seguirão no Paraná. No inquérito que será encaminhado ao Ministério Público Estadual, ela recomendará a notificação das polícias civis dos Estados onde possivelmente havia compradores.
Ela ainda adiantou que os irmãos foram indiciados por suspeita de comercializar ossos humanos, o que é considerado crime no Brasil. Se condenados, Kleber e Carlo podem pegar até oito anos de prisão cada. A prisão preventiva deles foi decretada pela Justiça do Paraná antes mesmo do encontro dos ossos, no entanto o advogado dos irmãos, Omar José Baddauy, afirmou que irá pedir a revogação por entender que “ela não é necessária” e que “as coisas não são exatamente como estão sendo comentadas”.